Na noite dessa quarta-feira, 27 de maio, foi realizada a webconferência “A dimensão social e seus impactos na saúde mental em tempos de pandemia”. A professora Dra. Maria Zilda Soares, coordenadora do curso de Psicologia no Centro Universitário Santo Agostinho, recebeu a palestrante convidada, Dra. Kátia Bautheney, da Universidade de São Paulo (USP). A palestrante iniciou falando sobre as notas emitidas por associações internacionais de saúde mental tratando da tendência mundial a um crescente estresse pós-traumático depois da pandemia, de maneira semelhante a um pós-guerra, em que mesmo nos tempos de paz, as pessoas ainda carregam sofrimento psíquico, devido ao medo do “vírus estranho”, do temor da destrutividade, pelo período de luto simbólico, real ou efetivo, seja de um emprego e, principalmente, por um mundo que não será mais o mesmo.
“Estamos encontrando, na mídia, pautas que destacam a importância de cuidar da nossa saúde mental. Como psicanalista, é muito difícil separar a dimensão física da mental, uma vez que o físico reside no limite entre o somático e o psíquico. O nosso psiquismo está espalhado no nosso corpo todo, tem projeção na saúde física. Nós estamos acompanhando esta informação sobre aumento dos casos de depressão e, se pensarmos etimologicamente na palavra, depressão vem de excesso de pressão, reação a mundo externo, cuidados, exigência, reclusão. A dificuldade do nosso mundo interno de lidar com uma situação inesperada como a pandemia, por isso alguns têm crises de pânico e sentimentos de que o perigo mora ao lado, excesso de limpeza, receio de estar contaminado, ampliação de hipocondria… Incremento de situações de suicídio e de ideações suicidas, essa situação é muito opressora para alguns, falta de perspectivas, de esperança no futuro e de concentração, baseado em fatores intrapsíquicos ou extrapsíquicos”, explicou a professora.
Para ilustrar, a palestrante citou os conceitos de neurose de guerra e traumática pensados por Freud, além de falar sobre o susto enquanto estado de perigo inesperado, tal qual como a pandemia, circunstância que ninguém estava esperando. “Estávamos em fevereiro, indo para o carnaval, praia, escolas, universidades e, de repente, sair virou risco de vida. A situação seguinte é a do medo, quando encontramos um objeto definido que temos temor, objeto imaginário ou um dado da realidade. Significa esperar o perigo e se preparar para ele, aí tem o medo de perder as pessoas, perder o emprego, medo da situação econômica, política. Aqui ressalto outro ponto que está acontecendo na circunstância da pandemia, o disparo na prescrição e venda de ansiolíticos, na situação atual é compreensível estar ansioso, como forma de preparação para o perigo iminente, mas é preocupante que a medicação tome o lugar da elaboração, ao tempo em que abre brechas para o uso indiscriminado e excessivo”, conclui.
A professora tratou ainda da sua experiência na clínica, das queixas e relatos que tem recebido nos atendimentos telepresenciais, ela reforça que os pacientes estão sonhando mais nesse período e que já existem grupos de pesquisa na USP que estão estudando os sonhos nos tempos de pandemia. “Nem todo sonho é tentativa de realização de desejos, são sonhos de repetição, masoquistas, situações vividas sofridas, reproduzidos para punir, sonhos de angustia que fazem a gente acordar e trazem risco ao insconsciente. E sonhos traumáticos, sonhos que tem função de produzir ansiedade como se eles tivessem devolvendo para a gente uma ansiedade de uma situação traumática, uma coisa semelhante para lidar com susto medo e angustia e no jogo com coisas aflitivas, na tentativa de dominar algo que nos deixa ansioso, nos traz medo. Atualmente, o filme mais visto na netflix é o filme contágio. Por que a gente vai assistir um filme sobre uma epidemia que vai dizimar a população? Ou vontade de jogar jogos de terror… porque traz a dimensão de viver ativamente, o que eles estão agindo passivamente. Lidar com a morte, controlar a morte. Compulsão a repetição, atração pelo que nos faz sofrer… Sentido saudável, lidar, entender”, explicou.
Para finalizar, a professora Kátia falou sobre a importância do pacto civilizatório diante de uma ameaça externa e trouxe como perspectiva o que nós podemos fazer em termos de preservação. Segundo ela, seria o cuidado consigo, o cuidado com o outro e com o social que incrementa a pulsão de vida e vai além do risco real da pandemia, da negação do risco, da doença, da dor, do sofrimento humano, da desigualdade social e daquilo que aumenta a pulsão de morte. “Não dá para fingir que nada está acontecendo… É uma situação muito complexa e que necessita de elaboração, precisamos ter certas garantias de preservação, para além da nossa vida, a preservação do estado, da democracia. Estamos diante do desamparo, precisamos de liderança em relação ao desamparo, para sermos acolhidos e acolher precisamos também de informações, do jornalismo, de ciência, das escolas e universidades, precisamos de um acesso democrático ao conhecimento e que tudo isso nos sirva para a elaboração da ansiedade e angustia que nos assolam. Nós precisamos de laços”, finalizou.
Depois dos questionamentos dos participantes, a professora Zilda Soares complementou que precisamos cuidar da nossa humanidade através do cuidado com o outro e que, mesmo em meio ao sofrimento e a dor, nós não devemos ficar adormecidos, pois precisamos zelar pelo mundo que virá e contribuir para as transformações de maneira ativa.
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